Catecismo da Igreja Católica 988-1065

ARTIGO 11

“CREIO NA RESSURREIÇÃO DA CARNE”

988.             O Credo cristão — profissão de nossa fé em Deus Pai, Filho e Espírito Santo, e em sua ação criadora, salvadora e santificadora — culmina na proclamação da ressurreição dos mortos, no fim dos tempos e na vida eterna.


989.             Cremos firmemente – e assim, esperamos – que, da mesma forma que Cristo ressuscitou verdadeiramente dos mortos e vive para sempre, assim também, depois da morte, os justos viverão para sempre com Cristo ressuscitado e que ele os ressuscitará no último dia. Como a ressurreição de Cristo, também a nossa será obra da Santíssima Trindade:

 “Se o Espírito daquele que ressuscitou Cristo dentre os mortos habita em vós, aquele que ressuscitou Cristo dentre os mortos vivificará também vossos corpos mortais, pelo seu Espírito que habita em vós” (Rm 8, 11).


990.             O termo “carne” designa o homem em sua condição de fraqueza e mortalidade. A “ressurreição da carne” significa que, após a morte, não haverá somente a vida da alma imortal, mas que também nossos “corpos mortais” (Rm 8, 11) readquirirão vida.


991.             Crer na ressurreição dos mortos foi, desde o início, um elemento essencial da fé cristã. “Fiducia christianorum resurrectio mortuorum; ilían credentes, sumus – A confiança dos cristãos é a ressurreição dos mortos; crendo nela, somos cristãos”:

“Como podem alguns dentre vós dizer que não há ressurreição dos mortos? Se não há ressurreição dos mortos, então Cristo não ressuscitou. E se Cristo não ressuscitou, a nossa pregação é sem fundamento, e sem fundamento também é a vossa fé. Mas, na realidade, Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram” (1 Cor 15, 12-14, 20).


                        I.      A ressurreição de Cristo e a nossa revelação progressiva da ressurreição


992.             A ressurreição dos mortos foi revelada progressivamente por Deus a seu povo. A esperança na ressurreição corporal dos mortos foi se impondo como consequência intrínseca da fé em um Deus criador do homem inteiro, alma e corpo. O criador do céu e da terra é também aquele que mantém fielmente sua aliança com Abraão e sua descendência. Nesta dupla perspectiva, começará a se exprimir a fé na ressurreição. Nas provações, os mártires Macabeus confessam:

“O Rei do universo nos fará ressurgir para uma vida eterna, a nós que morremos por suas leis” (2 Mac 7, 9). É melhor para nós, entregues à morte pelos homens, esperar, da parte de Deus, que seremos ressuscitados por Ele” (2 Mac 7, 14).


993.             Os fariseus e muitos contemporâneos do Senhor esperavam a ressurreição. Jesus a ensina com firmeza. Aos saduceus que a negam, ele responde: “Acaso não estais errados, porque não compreendeis as Escrituras, nem o poder de Deus?” (Mc 12, 24). A fé na ressurreição baseia-se na fé em Deus, que “é Deus não de mortos, mas de vivos” (Mc 12, 27).


994.             Mais ainda: Jesus liga a fé na ressurreição à sua própria pessoa: “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11, 25). É Jesus mesmo quem, no último dia, há de ressuscitar os que nele tiveram crido e que tiverem comido seu corpo e bebido seu sangue. Desde já, ele fornece um sinal e uma garantia disto, restituindo a vida a alguns mortos, anunciando com isso sua própria ressurreição, que, no entanto, será de outra ordem. Deste acontecimento único ele fala como do “sinal de Jonas”, do sinal do Templo: anuncia sua ressurreição, que ocorrerá no terceiro dia depois de ser entregue à morte.


995.             Ser testemunha de Cristo é ser “testemunha da sua ressurreição” (At 1, 22), “nós, que comemos e bebemos com Jesus, depois que ressuscitou dos mortos” (At 10, 41). A esperança cristã na ressurreição está toda marcada pelos encontros com Cristo ressuscitado. Ressuscitaremos como ele, com ele e por ele.


996.             Desde o início, a fé cristã na ressurreição deparou com incompreensões e oposições. “Em nenhum ponto a fé cristã se depara com mais contradição do que em torno da ressurreição da carne”. Aceita-se muito comumente que, depois da morte, a vida da pessoa humana prossegue de modo espiritual. Como, porém, crer que este corpo tão manifestamente mortal possa ressuscitar para a vida eterna?


DE QUE MANEIRA OS MORTOS RESSUSCITAM?

997.             O que é “ressuscitar”? Na morte, que é separação da alma e do corpo, o corpo do homem cai na corrupção, ao passo que sua alma vai ao encontro de Deus, ficando à espera de ser novamente unida a seu corpo glorificado. Deus, em sua onipotência, restituirá definitivamente a vida incorruptível a nossos corpos, unindo-os às nossas almas, pela virtude da ressurreição de Jesus.


998.             Quem ressuscitará? Todos os homens que morreram: “Aqueles que fizeram o bem ressuscitarão para a vida; e aqueles que praticaram o mal ressuscitarão para a condenação” (Jo 5, 29).


999.             De que maneira? Cristo ressuscitou com seu próprio corpo - “Vede minhas mãos e meus pés: sou eu mesmo!” (Lc 24, 39). Ele, porém, não voltou à vida terrestre. Da mesma forma, nele “todos ressuscitarão com seu próprio corpo, que têm agora”; porém, este corpo será “transfigurado em corpo de glória”, em “corpo espiritual” (1 Cor 15, 44):

“Mas dirá alguém, em que forma é que os mortos vão ressuscitar? Com qual corpo voltarão? Insensato! Aquilo que semeias morre primeiro e só depois é vivificado; e o que semeias não é a planta já desenvolvida – como será mais tarde – mas um simples grão digamos, de trigo ou de qualquer outro cereal […]. É preciso que este ser corruptível se vista de incorruptibilidade e este ser mortal se vista de imortalidade” (1 Cor 15, 35-37. 42. 52-53).


1000.         Este “como” ultrapassa nossa imaginação e nosso entendimento, sendo acessível somente na fé. Nossa participação na Eucaristia, no entanto, já nos dá um antegozo da transfiguração de nosso corpo, por Cristo:

“Assim como o pão, fruto da terra, depois de ter recebido a invocação de Deus, não é mais pão comum, mas Eucaristia, constituída por duas realidades, uma terrestre e outra celeste, da mesma forma nossos corpos que participam da Eucaristia não são mais corruptíveis, pois têm a esperança da ressurreição”.


1001.         Quando? Definitivamente o “no último dia” (Jo 6, 39-40.44.54; 11, 24), “no fim do mundo”. Com efeito, a ressurreição dos mortos está intimamente associada à parusia de Cristo:

“Pois o Senhor mesmo, à voz do arcanjo e ao som da trombeta de Deus, descerá do céu. E então ressuscitarão, em primeiro lugar” (1 Ts 4, 16).


RESSUSCITADOS EM CRISTO

1002.         Se é verdade que Cristo nos ressuscitará “no último dia”, também é verdade que, de certo modo, já ressuscitamos com Cristo, pois, graças ao Espírito Santo, a vida cristã é, já agora na terra, uma participação na morte e na ressurreição de Cristo:

“No Batismo, fostes sepultados com ele, com ele também fostes ressuscitastes, pela fé na força de Deus que o ressuscitou dentre os mortos. […] Se ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas do alto, onde Cristo está entronizado à direita de Deus” (Cl 2, 12; 3, 1).


1003.         Unidos a Cristo pelo Batismo, os crentes participam realmente na vida celeste de Cristo ressuscitado, mas esta vida permanece “escondida com Cristo em Deus” (Cl 3, 3). “Ele nos ressuscitou com Cristo e com ele nos fez sentar nos céus, em virtude de nossa união com Cristo Jesus” (Ef 2, 6). Nutridos com seu Corpo na Eucaristia, já pertencemos ao Corpo de Cristo. Quando ressuscitarmos, no último dia, nós também seremos “manifestados com Ele, cheios de glória” (Cl 3, 4).


1004.         Enquanto aguarda esse dia, o corpo e a alma do crente participam desde já da dignidade de ser “de Cristo”; daí a exigência do respeito para com seu próprio corpo, mas também para com o de outrem, particularmente quando este sofre:

“O corpo, porém, não é para a prostituição, ele é para o Senhor, e o Senhor é para o corpo; Deus, que ressuscitou o Senhor, nos ressuscitará também a nós, pelo seu poder. Acaso, ignorais que vosso corpo é templo do Espírito Santo que mora em vós e que recebestes de Deus? […] Não pertenceis a vós mesmos. […] Então, glorificai a Deus no vosso corpo” (1 Cor 6, 13-15. 19-20).


                    II.      Morrer em Cristo Jesus


1005.         Para ressuscitar com Cristo é preciso morrer com Cristo, é preciso “deixar a moradia do nosso corpo, para ir morar junto do Senhor” (2 Cor 5, 8). Nesta “partida”, que é a morte, a alma é separada do corpo. Ela será reunida a seu corpo no dia da ressurreição dos mortos.


A MORTE

1006.         “Diante da morte, o enigma da condição humana atinge seu ponto mais alto”. Em certo sentido, a morte corporal é natural; mas para a fé ela é, na realidade, “a paga do pecado” (Rm 6, 23). Para os que morrem na graça de Cristo, é participação na morte do Senhor, a fim de poder participar também de sua ressurreição.


1007.         A morte é o término da vida terrestre. Nossas vidas são medidas pelo tempo, ao longo do qual passamos por mudanças, envelhecemos e, como acontece com todos os seres vivos da terra, a morte aparece como o fim normal da vida. Este aspecto da morte da morte marca nossas vidas com um caráter de urgência: a lembrança de nossa mortalidade serve também pra nos recordar de que temos um tempo limitado para realizar nossa vida:

“Lembra-te de teu Criador nos dias de tua mocidade […] antes que volte o pó à terra, de onde veio, e o Espírito retorne a Deus, que o concedeu” (Ecl 12, 1.7).


1008.         A morte é consequência do pecado. Intérprete autêntico das afirmações da Sagrada Escritura e da tradição, o magistério da Igreja ensina que a morte entrou no mundo por causa do pecado do homem. Embora o homem tivesse uma natureza mortal, Deus o destinava a não morrer. A morte foi, portanto, contrária aos desígnios de Deus criador e entrou no mundo como consequência do pecado. “A morte corporal, à qual o homem teria sido subtraído se não tivesse pecado”, é assim, “o último inimigo” (1 Cor 15, 26) do homem a ser vencido.


1009.         A morte é transformada por Cristo. Jesus, o Filho de Deus, sofreu também ele a morte, própria da condição humana. Todavia, apesar de seu pavor diante dela, a assumiu em um ato de submissão total e livre à vontade de seu Pai. A obediência de Jesus transformou a maldição da morte em bênção.


O SENTIDO DA MORTE CRISTÃ

1010.         Graças a Cristo, a morte cristã tem um sentido positivo. “Para mim, de fato, o viver é Cristo e o morrer, lucro” (Fl 1, 21). “É digna de fé esta palavra: se já morremos com ele, também com Ele viveremos” (2 Tm 2, 11). A novidade essencial da morte cristã está nisto: pelo Batismo, o cristão já está sacramentalmente “morto com Cristo”, para viver de uma vida nova. Se morrermos na graça de Cristo, a morte física consuma este “morrer com Cristo” e completa, assim, nossa incorporação a ele em seu ato redentor:

“É bom para mim morrer em (‘eis’) Cristo Jesus, melhor do que reinar até as extremidades da terra. É a ele que procuro, ele que morreu por nós: é ele que quero, ele que ressuscitou por nós. Meu nascimento aproxima-se. […] Deixai-me receber a pura luz; quando tiver chegado lá, serei homem”.


1011.         Na morte, Deus chama o homem a si. É por isso que o cristão pode sentir, em relação à morte, um desejo semelhante ao de São Paulo: “partir para estar com Cristo” (Fl 1, 23); e transformar sua própria morte em um ato de obediência e de amor ao Pai, a exemplo de Cristo:

“Meu desejo terrestre foi crucificado; […] há em mim uma água viva que murmura e que diz dentro de mim: “Vem para o Pai”.

“Quero ver a Deus e, para vê-lo, é preciso morrer”.

“Eu não morro, entro na vida”.


1012.         A visão cristã da morte é expressa, de forma privilegiada, na liturgia da Igreja:

“Senhor, para os que creem em vós, a vida não é tirada, mas transformada. Desfeito nosso corpo mortal, nos é dado, nos céus, um corpo imperecível”.


1013.         A morte é o fim da peregrinação terrestre do homem, do tempo de graça e de misericórdia que Deus lhe oferece para realizar sua vida terrestre, segundo o projeto divino, e para decidir seu destino último. Quando tiver terminado “o único curso de nossa vida terrestre, não voltaremos mais a outras vidas terrestres”. “Os homens morrem uma só vez” (Hb 9, 27). Não existe “reencarnação” depois da morte.


1014.         A Igreja nos encoraja à preparação da hora de nossa morte (“Livra-nos, Senhor, de uma morte súbita e imprevista”: antiga ladainha de todos os santos), ao pedir à Mãe de Deus que interceda por nós “na hora da nossa morte” (oração da “Ave-Maria”) e ao nos entregar a São José, padroeiro da boa morte:

“Em todas as tuas ações os teus pensamentos, deverias te comportar como se tivesse de morrer hoje. Se tua consciência estivesse tranquila, não terias muito medo da morte. Seria melhor evitar o pecado que fugir da morte. Se não estás preparado hoje, como o estarás amanhã?”.

“Louvado sejas, meu Senhor, por nossa irmã, a morte corporal, da qual homem algum pode escapar. Ai dos que morrerem em pecado mortal, felizes aqueles que ela encontrar conforme a vossa santíssima vontade, pois a segunda morte não lhes fará mal”.


Resumindo:


1015.         “Caro salutis est cardo – A carne é o eixo da salvação”. Cremos em Deus, que é o criador da carne; cremos no Verbo feito carne para redimir a carne; cremos na ressurreição da carne, consumação da criação e da redenção da carne.


1016.         Pela morte, a alma é separada do corpo, mas, na ressurreição, Deus restituirá a vida incorruptível ao nosso corpo transformado, o unindo novamente à nossa alma. Assim como Cristo ressuscitou e vive para sempre, todos nós ressuscitaremos no último dia.


1017.         “Cremos na verdadeira ressurreição desta carne que possuímos agora”. “Semeia-se um corpo só com vida natural, ressuscita um corpo espiritual” (1 Cor 15, 44).


1018.         Em consequência do pecado original, o homem deve sofrer “a morte corporal, à qual teria sido subtraído se não tivesse pecado”.


1019.         Jesus, o Filho de Deus, sofreu livremente a morte por nós em uma submissão total e livre à vontade de Deus, seu Pai. Por sua morte, ele venceu a morte, abrindo, assim, a todos os homens a possibilidade da salvação.

ARTIGO 12

“CREIO NA VIDA ETERNA”

1020.         O cristão, que une sua própria morte à de Jesus, vê a morte como um caminhar ao seu encontro e uma estrada na Vida Eterna. Depois de a Igreja, pela última vez, pronunciar as palavras de perdão da absolvição de Cristo sobre o cristão moribundo; marcá-lo pela última vez, com uma unção fortificadora; dar-lhe o Cristo no viático como alimento para a viagem, lhe diz, com doce e segurança estas palavras:

“Deixa este mundo, alma cristã, em nome do Pai Todo-Poderoso que te criou, em nome de Jesus Cristo, o Filho de Deus vivo, que sofreu por ti, em nome do Espírito Santo que foi derramado em ti. Toma teu lugar hoje na paz e fixa tua morada com Deus na santa Sião, com a Virgem Maria, a Mãe de Deus, com São José, os anjos e todos os santos de Deus. […] Volta para junto de teu Criador, que te formou do pó da terra. Que na hora em que tua alma sair de teu corpo se apressem ao teu encontro Maria, os anjos e todos os santos. […] Que possas ver teu Redentor face a face e possas contemplar a Deus pelos séculos dos séculos”.


                        I.          O juízo particular


1021.         A morte põe fim à vida do homem como tempo aberto ao acolhimento ou à recusas da graça divina, manifestada em Cristo. O Novo Testamento fala do juízo principalmente na perspectiva do encontro final com Cristo, em sua segunda vinda. Repedidas vezes, porém, afirma também a retribuição, imediatamente depois da morte, de cada um em função de suas obras e de sua fé. A parábola do pobre Lázaro e a palavra de Cristo na cruz ao bom ladrão, assim como outros textos do Novo Testamento, falam de um destino último da alma, que pode ser diferente para uns e outros.


1022.         Cada homem recebe, em sua alma, a retribuição eterna a partir do momento da morte, num juízo particular que coloca sua vida em relação à vida de Cristo, seja por meio de uma purificação, seja para entrar de imediato na felicidade do céu, seja para condenar-se de imediato para sempre.

“No entardecer de nossa vida, seremos julgados sobre o amor”.


                    II.          O céu


1023.         Os que morrem na graça e na amizade de Deus e que estão totalmente purificados vivem para sempre com Cristo. São para sempre semelhantes a Deus, porque o veem “tal como ele é” (1 Jo 3, 2), face a face (1 Cor 13, 12):

“Com nossa autoridade apostólica, definimos que, segundo a disposição geral de Deus, as almas de todos os santos mortos antes da Paixão de Cristo […] e de todos os outros fiéis mortos depois de receberem o santo Batismo de Cristo, nos quais não houve nada a purificar quando morreram, […] ou ainda, se houve ou há algo a purificar, quando, depois de sua morte, tiverem acabado de fazê-lo […], antes mesmo da ressurreição em seus corpos e do juízo geral, e isto desde a ascensão do Senhor e Salvador Jesus Cristo ao céu, estiveram, estão e estarão no céu, associados, no reino dos céus e no paraíso celeste, com Cristo, juntamente com os santos anjos. Desde a paixão e morte de nosso Senhor Jesus Cristo, viram e veem a essência divina com uma visão intuitiva e até face a face, sem a mediação de nenhuma criatura”.


1024.         Esta vida perfeita com a Santíssima Trindade, essa comunhão de vida e de amor com ela, com a Virgem Maria, os anjos e todos os bem-aventurados é denominada “o céu”. O céu é o fim último e a realização das aspirações mais profundas do homem, o estado de felicidade suprema e definitiva.


1025.         Viver no céu é “estar com Cristo”. Os eleitos vivem “n’Ele”; mas n’Ele conservam, ou melhor, encontram a sua verdadeira identidade, o seu nome próprio:

Vita est enim esse cum Christo; ide ubi Christus, ibi vita, ibi regnum – Vida é, de fato, estar com Cristo; aí onde está Cristo, aí está a vida, aí está o Reino”.


1026.         Por sua morte e ressurreição, Jesus Cristo nos “abriu” o céu. A vida dos bem-aventurados consiste na posse, em plenitude, dos frutos da redenção operada por Cristo, que associa à sua glorificação celeste os que creram nele e que ficaram fiéis à sua vontade. O céu é a comunidade bem-aventurada de todos os que estão perfeitamente incorporados a ele.


1027.         Este mistério de comunhão bem-aventurada com Deus e com todos os que estão em Cristo supera toda compreensão e toda imaginação. A Escritura nos fala dele em imagens: vida, luz, paz, festa de casamento, vinho do Reino, casa do Pai, Jerusalém celeste, paraíso. “É algo que os olhos jamais viram, nem os ouvidos ouviram, nem coração algum jamais pressentiu” (1 Cor 2, 9).


1028.         Em razão de sua transcendência, Deus só poderá ser visto tal como é quando ele mesmo abrir seu mistério à contemplação direta do homem e o capacitar para tanto. Esta contemplação de Deus em sua glória celeste é chamada pela Igreja “visão beatífica”:

“Esta será tua glória e tua felicidade: ser admitido a ver Deus, ter a honra de participar das alegrias da salvação e da luz eterna na companhia de Cristo, o Senhor teu Deus; […] desfrutar, no Reino dos Céus, na companhia dos justos e dos amigos de Deus, as alegrias da imortalidade adquirida”.


1029.         Na glória do Céu, os bem-aventurados continuam a cumprir, com alegria, a vontade de Deus em relação aos outros homens e a à criação inteira. Já reinam com Cristo; com Ele “reinarão por toda a eternidade” (Ap 22, 5).


                 III.          A purificação final ou purgatório


1030.         Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não estão completamente purificados, embora tenham garantida sua salvação eterna, passam, após sua morte, por uma purificação, a fim de obter a santidade necessária para entrar na alegria do céu.


1031.         A Igreja denomina purgatório esta purificação final dos eleitos, que é absolutamente diferente do castigo dos condenados. A Igreja formulou a doutrina da fé relativamente ao purgatório, sobretudo nos Concílios de Florença e de Trento. Fazendo referência a certos textos da Escritura, a tradição da Igreja fala de um fogo purificador:

“No que concerne a certas faltas leves, deve-se crer que existe, antes do juízo, um fogo purificador, de fato, aquele que é a Verdade afirma: ‘a blasfêmia’ contra o Espírito Santo não será perdoada, nem neste mundo, nem no mundo que há de vir’ (Mt 12, 32). Desta afirmação podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas no século presente, ao passo que outras, no século futuro”.


1032.         Este ensinamento apoia-se também na prática da oração pelos defuntos, da qual já a Sagrada Escritura fala – “Eis por que mandou fazer o sacrifício expiratório pelos falecidos, a fim de que fossem absolvidos de seu pecado” (2 Mc 12, 46). Desde os primeiros tempos, a Igreja honrou a memória dos defuntos e ofereceu sufrágios em seu favor, em especial o sacrifício eucarístico, a fim de que, purificados, eles possam chegar à visão beatífica de Deus. A Igreja recomenda também as esmolas, as indulgências e as obras de penitência em favor dos defuntos:

“Levemos a eles socorro e celebremos sua memória. Se os filhos de Jó foram purificados pelo sacrifício de seu pai, por que deveríamos duvidar de que nossas oferendas em favor dos mortos lhes levem alguma consolação? Não hesitemos em socorrer os que partiram e em oferecer nossas orações por eles”.


                 IV.          O Inferno


1033.         Não podemos estar unidos a Deus, se não fizermos livremente a opção de amá-lo. Não podemos, porém, amar a Deus, se pecamos gravemente contra ele, contra nosso próximo ou contra nós mesmos – “Quem não ama permanece na morte. Todo aquele que odeia seu irmão é um homicida. E sabeis que nenhum homicida tem a vida eterna permanecendo nele” (1 Jo 3, 14-15). Nosso Senhor nos adverte de que seremos separados dele, se deixarmos de ir ao encontro das necessidades graves dos pobres e dos pequenos que são seus irmãos. Morrer em pecado mortal sem ter se arrependido dele e sem saber o amor misericordioso de Deus significa ficar separado do Todo-Poderoso para sempre, por nossa própria opção livre. A este estado de autoexclusão definitiva da comunhão com Deus e com os bem-aventurados se designa com a palavra “Inferno”.


1034.         Jesus fala, muitas vezes, da “geena”, do “fogo que não se apaga”, reservado aos que recusam, até o fim de sua vida, crer e converter-se, e no qual se pode perder, ao mesmo tempo, a alma e o corpo. Jesus anuncia em termos graves que “enviará seus anjos e eles retirarão do seu Reino toda causa do pecado e os que praticam o mal, depois, serão jogados na fornalha de fogo” (Mt 13, 41-42), e que pronunciará a condenação: “Afastai-vos de mim, malditos! Ide para o fogo eterno!” (Mt 25, 41).


1035.         O ensinamento da Igreja afirma a existência e a eternidade do Inferno. As almas dos que morrem em estado de pecado mortal descem, imediatamente, após a morte, aos infernos, onde sofrem as penas do Inferno, “o fogo eterno”. A pena principal do inferno consiste na separação eterna de Deus, o único em quem o homem pode ter a vida e a felicidade para as quais foi criado e às quais aspira.


1036.         As afirmações da Sagrada Escritura e os ensinamentos da Igreja acerca do Inferno são um chamado a responsabilidade com a qual o homem deve usar sua liberdade, em vista de seu destino eterno. Constituem também um apelo insistente à conversão: “Entrai pela porta estreita! Pois larga é a porta e espaçoso o caminho que leva à perdição, e são muitos os que entram! Como é estreita a porta e apertado o caminho que leva à vida, e poucos são os que o encontram!” (Mt 7, 13-14):

“Como desconhecemos o dia e a hora, conforme a advertência do Senhor, vigiemos constantemente para que, terminado o único curso de nossa vida terrestre, possamos entrar com ele para as bodas e mereçamos ser contados entre os benditos, e não sejamos, como servos maus e preguiçosos, obrigados a ir parar o fogo eterno, para as trevas exteriores, onde haverá choro e ranger de dentes”.


1037.         Deus não predestina ninguém para o inferno; para isso é preciso uma aversão voluntária a Deus (um pecado mortal) e a persistência nela até o fim. Na liturgia eucarística e nas orações cotidianas de seus fiéis, a Igreja implora a misericórdia de Deus, o qual não quer “que ninguém se perca. Ao contrário, quer que todos venham a converter-se” (2 Pe 3, 9):

“Recebei, ó Pai, com bondade, a oferenda de vossos servos e de toda a vossa família; dai-nos sempre a vossa paz, livrai-nos da condenação e acolhei-nos entre os vossos eleitos”.


                     V.          O Juízo final


1038.         A ressurreição de todos os mortos, “dos justos e dos injustos” (At 24, 15), antecederá o Juízo Final. Este será “a hora em que todos os que estão nos túmulos ouvirão sua voz, e sairão. Aqueles que fizeram o bem ressuscitarão para a vida; e aqueles que praticaram o mal, ressuscitarão para a condenação” (Jo 5, 28-29). Então quando Cristo “vier em sua glória, acompanhado de todos os anjos. […] Todas as nações da terra serão reunidas diante dele, e ele separará uns dos outros, assim como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. E colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos, à sua esquerda […]. E estes irão para o castigo eterno, enquanto os justos irão para a Vida Eterna” (Mt 25, 31-33.46).


1039.         Diante de Cristo – que é a Verdade – será definitivamente desvendada a verdade sobre a relação de cada homem com Deus. O juízo final há de revelar, até às suas últimas consequências, o que alguém tiver feito de bem ou deixado de fazer durante sua vida terrestre:

“Todo o mal que os maus praticam é registrado sem que o saibam. No dia em que chegará” o nosso Deus e não se calará” (Sl 50, 3), se voltará para os maus e lhes dirá: “Eu havia colocado na terra meus pobrezinhos para vós. Eu, seu chefe, reinava no céu à direita do meu Pai, mas, na terra meus membros passavam fome. Se tivésseis dado aos meus membros, vosso dom teria chegado até a Cabeça. Quando coloquei meus pobrezinhos na terra, os constituí meus tesoureiros para recolher vossas boas obras em meu tesouro; vós, porém, nada depositastes em suas mãos, razão por que nada possuís junto a mim.”


1040.         O juízo final acontecerá por ocasião da volta gloriosa de Cristo. Só o Pai conhece a hora e o dia desse juízo, só ele decide seu advento. Por meio de seu Filho, Jesus Cristo, ele pronunciará então sua palavra definitiva sobre toda a história. Conheceremos então o sentido último de toda a obra da criação e de toda a economia da salvação, compreenderemos os caminhos admiráveis pelos quais sua providência terá conduzido tudo para seu fim último. O juízo final revelará que a justiça de Deus triunfa de todas as injustiças cometidas por suas criaturas e que seu amor é mais forte do que a morte.


1041.         A mensagem do juízo final é apelo à conversão enquanto Deus dá aos homens “o momento favorável, o dia da salvação” (cf. 2Cor 6, 2). O juízo final inspira o santo temor de Deus. Compromete com a justiça do Reino de Deus. Anuncia a “ditosa esperança” (Tt 2, 13) da volta do Senhor, “quando ele vier, naquele dia, para ser glorificado nos seus santos e para ser admirado em todos os que tiverem crido” (2 Ts 1, 10).


                 VI.          A esperança dos céus novos e da terra nova


1042.         No fim dos tempos, o Reino de Deus chegará à sua plenitude. Depois do juízo universal, os justos reinarão para sempre com Cristo, glorificados em corpo e alma, e o próprio universo será renovado:

Então a Igreja será “consumada na glória celeste, quando chegar o tempo da restauração de todas as coisas, e, com o gênero humano, também o mundo todo, que está intimamente ligado ao homem e por meio dele atinge sua finalidade, encontrará sua restauração definitiva em Cristo”.


1043.         A esta renovação misteriosa, que há de transformar a humanidade e o mundo, a Sagrada Escritura denomina “novos céus e uma nova terra” (2Pd 3, 13). Será a realização definitiva do projeto de Deus “para realizá-lo na plenitude dos tempos reencabeçar tudo em Cristo, tudo o que existe no céu e na terra” (Ef 1, 10).


1044.         Neste “universo novo”, a Jerusalém celeste, Deus terá sua morada entre os homens. “Ele enxugará toda lágrima dos seus olhos. A morte não existirá mais, e não haverá mais luto, nem grito, nem dor, porque as coisas anteriores passaram” (Ap 21, 4).


1045.         Para o homem, esta consumação será a realização última da unidade do gênero humano, desejada por Deus desde a criação e da qual a Igreja peregrinante era “como o sacramento”. Vi também a cidade santa, a nova Jerusalém, descendo do céu, de junto de Deus, (Ap 21, 2), “a Esposa do Cordeiro” (Ap 21, 9). Ela não será mais ferida pelo pecado, pelas impurezas, pelo amor-próprio, que destroem ou ferem a comunidade terrestre dos homens. A visão beatífica, na qual Deus se revelará de maneira inesgotável aos eleitos, será a fonte inesgotável de felicidade, de paz e de comunhão mútua.


1046.         Quanto ao cosmos, a Revelação afirma a profunda comunidade de destino do mundo material e do homem:

De fato, toda a criação espera ansiosamente a revelação dos filhos de Deus. […] Também a própria criação espera ser libertada da escravidão da corrupção […]. Com efeito, sabemos que toda a criação, até o presente, está gemendo como que em dores de parto, e não somente ela, mas, também nós, que temos as primícias do Espírito, gememos em nosso íntimo, esperando a condição filial, a redenção de nosso corpo” (Rm 8, 19-23).


1047.         O universo visível também está, portanto, destinado a ser transformado, “a fim de que o próprio mundo, restaurado em seu primeiro estado, sem mais nenhum obstáculo, a serviço dos justos”, participando de sua glorificação em Cristo ressuscitado.


1048.         “Ignoramos o tempo da consumação da terra e da humanidade e desconhecemos a maneira de transformação do universo. Passa certamente e aparência deste mundo deformada pelo pecado, mas aprendemos que Deus prepara nova morada e nova terra. Nela reinará a justiça e sua felicidade irá satisfazer e superar todos os desejos de paz que sobem aos corações dos homens”.


1049.         “Contudo, a expectativa de uma terra nova, longe de atenuar, deve impulsionar em vós a solicitude pelo aprimoramento desta terra. Nela cresce o corpo da nova humanidade que já pode, de algum modo, prefigurar o novo mundo. Por isso, ainda que se deva distinguir cuidadosamente o progresso terrestre do crescimento do reino de Cristo, tal processo é de grande importância para o Reino de Deus, na medida em que ele contribuir para melhor organizar a sociedade humana”.


1050.         “Com efeito, depois que propagarmos na terra, no Espírito do Senhor e por sua ordem, os valores da dignidade humana, da comunidade fraterna e da liberdade, todos estes bons frutos da natureza e de nosso trabalho, nós os encontraremos novamente – contudo limpos de toda impureza, iluminados e transfigurados – quando Cristo entregar ao Pai o reino eterno e universal”. Deus será, então, “tudo em todos” (1 Cor 15, 28), na vida eterna:

“A vida, em sua própria realidade e verdade, é o Pai que, pelo Filho e no Espírito Santo, a derrama sobre todos nós, como fonte dos dons celestes. Graças à sua bondade, promete, verdadeiramente, também a nós homens os divinos bens da vida eterna”.


Resumindo:


1051.         Cada homem, em sua alma imortal, recebe sua retribuição eterna a partir de sua morte, em um juízo particular feito por Cristo, juiz dos vivos e dos mortos.


1052.         “Cremos que as almas de todos os que morrem na graça de Cristo constituem o povo de Deus para além da morte, a qual será definitivamente vencida no dia da ressurreição, quando essas almas serão novamente unidas a seus corpos”.


1053.         “Cremos que a multidão daquelas almas que estão reunidas, no paraíso, em torno de Jesus e de Maria, forma a Igreja do céu, onde, na beatitude eterna, elas veem a Deus tal como Ele é, e onde estão também associadas, em graus diversos, como os santos anjos, ao governo divino exercido pelo Cristo na glória, intercedendo por nós e ajudando nossa fraqueza por sua solicitude fraterna”.


1054.         Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não estão totalmente purificados, embora seguros de sua salvação eterna, passam depois de sua morte por uma purificação, a fim de obterem a santidade necessária para entrar na alegria de Deus.


1055.         Em virtude da “comunhão dos santos”, a Igreja recomenda os defuntos à misericórdia de Deus e oferece, em favor deles, sufrágios, particularmente o santo sacrifício eucarístico.


1056.         Seguindo o exemplo de Cristo, a Igreja adverte os fiéis acerca da “triste e lamentável realidade da morte eterna”, denominada também “inferno”.


1057.         A pena principal do inferno consiste na separação eterna de Deus, o único em quem o homem pode ter a vida e a felicidade para as quais foi criado e às quais aspira.


1058.         A Igreja ora para que ninguém se perca: “Senhor, não permitais que eu jamais seja separado de vós”. Se é verdade que ninguém  pode salvar-se a si mesmo, também é verdade que “Ele quer que todos sejam salvos” (1 Tm 2, 4), e que para Ele “tudo é possível” (Mt 19, 26).


1059.         “A santíssima Igreja romana crê e confessa firmemente que, no dia do juízo, todos os homens comparecerão com seu próprio corpo diante do tribunal de Cristo para prestar contas de seus próprios atos”.


1060.         No fim dos tempos, o Reino de Deus chegará à sua plenitude. Então, os justos reinarão com Cristo para sempre, glorificados em corpo e alma; e o próprio universo material será transformado. Então Deus será “tudo em todos” (1 Cor 15, 28), na Vida Eterna.

“AMÉM”

1061.          O Credo, como também o último livro da Sagrada Escritura, termina com a palavra hebraica amen. Ela se encontra, com frequência, ao final das orações do Novo Testamento. Também a Igreja conclui suas orações com o “amém”.


1062.         Em hebraico, a palavra “amém” está ligada à mesma raiz da palavra “crer”. Esta raiz exprime a solidez, a confiabilidade, a fidelidade. Assim, compreendemos por que o “amém” pode expressar tanto a fidelidade de Deus para conosco como nossa confiança nele.


1063.         No profeta Isaías, encontramos a expressão “Deus de verdade”, literalmente “Deus do amém”, isto é, o Deus fiel às suas promessas – “quem quiser jurar neste país, há de jurar pelo Deus verdadeiro” (Is 65, 16). Nosso Senhor emprega, com frequência, o termo “amém”, por vezes em forma duplicada, para sublinhar a confiabilidade de seu ensinamento, sua autoridade fundada na verdade de Deus.


1064.         O “amém” final do Credo retoma e confirma, portanto, suas duas primeiras palavras: “eu creio”. Crer é dizer “amém” às palavras, às promessas, aos mandamentos de Deus; é confiar totalmente naquele que é o “Amém” de infinito amor e de fidelidade perfeita. A vida cristã de cada dia será, então, o “amém” ao “eu creio” da profissão de fé do nosso Batismo:

“O Símbolo seja para ti como um espelho. Olha-te nele, para veres se crês tudo o que declaras crer e alegra-te cada dia por tua fé”.


1065.         O próprio Jesus Cristo é o “Amém” (Ap 3, 14). Ele é o “Amém” definitivo do amor do Pai por nós; assume e consuma nosso “Amém” ao Pai – “todas as promessas de Deus têm o ‘sim’ garantido. Por isso, também, é por ele que dizemos ‘amém’ a Deus, para a sua glória” (2Cor 1, 20):

“Por Cristo, com Cristo, em Cristo,

a vós, Deus Pai Todo-Poderoso,

na unidade do Espírito Santo,

toda honra e toda a glória,

agora e para sempre.

Amém”.


A Infância e Adolescência Missionária (IAM) é uma Obra Pontifícia fundada em 19 de maio de 1843, por Dom Carlos Forbin-Janson. Presentes nos cinco continentes, as crianças e adolescentes missionários cultivam o espírito missionário universal, recitando uma Ave Maria por dia e doando um dinheiro por mês.